
O Brasil reduziu significativamente o percentual de crianças e adolescentes vivendo abaixo da linha da pobreza monetária entre 2017 e 2023, segundo o estudo Pobreza Multidimensional na Infância e Adolescência no Brasil – 2017 a 2023, divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) nesta quinta-feira (16).
Em 2017, 25,44% das crianças e adolescentes de até 17 anos estavam nessa condição; em 2023, o índice caiu para 19,14%, o equivalente a 9,8 milhões de jovens vivendo em famílias com renda inferior a R$ 355 mensais por pessoa. A pobreza extrema também recuou no período, embora ainda atinja 8,1% dessa faixa etária, ou cerca de 4,2 milhões de crianças e adolescentes que vivem com menos de R$ 209 mensais por pessoa.
Além da renda, o estudo analisou outras dimensões essenciais ao bem-estar de crianças e adolescentes, como acesso à educação, água potável, saneamento, moradia, proteção contra o trabalho infantil e segurança alimentar.
Os resultados mostram progresso em várias áreas:
- Água potável: o percentual de crianças sem acesso caiu de 6,8% em 2017 para 5,4% em 2023.
- Saneamento básico: a privação passou de 42,3% para 38%.
- Acesso à informação: a taxa de privação foi reduzida de 17,5% para 3,5%.
- Moradia adequada: houve queda de 13,2% para 11,2%.
- Segurança alimentar: a insegurança caiu de 50,5% em 2018 para 36,9% em 2023.
O número de crianças e adolescentes em situação de pobreza extrema, caracterizada pela privação em todas as dimensões analisadas, também recuou. Em 2017, eram 13 milhões (23,8%); em 2023, o número caiu para 9,8 milhões (18,8%).
No entanto, a privação relacionada ao trabalho infantil apresentou pouca variação: 1,7 milhão de crianças e adolescentes (3,4%) ainda estão nessa situação.
A redução da pobreza monetária está diretamente ligada à expansão dos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família. O estudo destaca que o programa teve papel fundamental para a melhoria dos índices.
Entre 2019 e 2023, o número de crianças e adolescentes que saíram da pobreza devido ao programa saltou de 750 mil para 4 milhões. O aumento da cobertura, especialmente com o Auxílio Emergencial e o Auxílio Brasil durante a pandemia, foi determinante para esse avanço.
Desigualdades
Apesar dos avanços, o Brasil ainda enfrenta desigualdades profundas. A pobreza multidimensional é mais acentuada entre crianças e adolescentes negros (63,6%) do que entre brancos (45,2%). Regionalmente, o Norte e o Nordeste concentram os maiores índices de privação, com destaque para o Piauí, onde 90,6% das crianças enfrentam alguma privação. No Sul e Sudeste, os números são menores, com São Paulo registrando o índice mais baixo (31,8%).
As disparidades são ainda mais evidentes nas áreas rurais, onde 95,3% das crianças enfrentam privações em pelo menos uma dimensão. Em contraste, nas áreas urbanas, o percentual é de 48,5%.
A privação de saneamento básico é especialmente grave nas zonas rurais, atingindo quase 92% das crianças, enquanto nas áreas urbanas o índice é de cerca de 28%.
Prioridade
Liliana Chopitea, chefe de Políticas Sociais do Unicef no Brasil, destaca que investir na infância é essencial não apenas para a garantia dos direitos, mas também para o desenvolvimento econômico do país.
“A pobreza afeta mais crianças e adolescentes porque estão em um momento crucial de desenvolvimento. Quando não têm acesso a direitos na idade certa, as consequências podem ser duradouras, prejudicando o futuro das crianças e também o potencial econômico do país. Políticas públicas que priorizem a infância e a adolescência devem ser prioridade nos orçamentos e nas estratégias nacionais”, afirma Chopitea.
O conceito de pobreza multidimensional, adotado pelo estudo, amplia a compreensão da pobreza ao incorporar privações em diversas áreas além da renda. “Direitos humanos são indivisíveis. Quando uma criança não tem acesso a um ou mais direitos, dizemos que está em pobreza multidimensional”, explica Chopitea.