
O Brasil ainda enfrenta dificuldades para recuperar os avanços na educação interrompidos pela pandemia de Covid-19, especialmente no que diz respeito ao acesso escolar e à alfabetização de crianças. Dados do estudo Pobreza Multidimensional na Infância e Adolescência no Brasil – 2017 a 2023, divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) nesta quinta-feira (16), mostram que, em 2023, os índices de alfabetização e acesso à educação ainda não retornaram aos níveis observados antes da pandemia, em 2019.
O estudo, baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-C) do IBGE, revela que 7,7% das crianças e adolescentes de até 17 anos estavam privados de educação em 2023. Esse percentual representa uma melhora em relação a 2021, quando chegou a 8,8%, mas ainda é superior aos 7,1% registrados em 2019.
Entre as crianças em situação mais grave, 619 mil não frequentam a escola, o equivalente a 1,2% do total de até 17 anos. Esse número é menor do que o registrado em 2021, durante a pandemia, quando a taxa foi de 2,3%. Contudo, ainda está acima do índice de 1,6% de 2019.
Ao todo, cerca de 4 milhões de crianças e adolescentes no Brasil enfrentam atrasos escolares, repetência ou não foram alfabetizados até os 7 anos de idade, o que evidencia o impacto prolongado da pandemia no sistema educacional.
Um dos aspectos mais preocupantes do relatório é o aumento do analfabetismo entre crianças de 8 anos. Em 2019, 14% delas não sabiam ler ou escrever; em 2023, esse índice subiu para cerca de 30%. Segundo o estudo, as crianças que estavam na faixa de 5 a 7 anos durante o auge da pandemia enfrentaram interrupções críticas no aprendizado, agravadas pela falta de acesso a recursos pedagógicos e suporte educacional.
Nas áreas rurais, a situação é ainda mais grave: 45% das crianças de 7 a 8 anos não estavam alfabetizadas em 2023. A desigualdade também é evidente quando analisada por renda. Entre os 25% mais pobres da população, 30% das crianças permanecem analfabetas, enquanto nos 20% mais ricos o índice é de 5,9%.
Políticas públicas
Diante do cenário, especialistas reforçam a necessidade de ações coordenadas para reverter os danos à educação. O governo federal lançou, em 2023, o programa Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, com o objetivo de garantir a alfabetização na idade certa, até o final do 2º ano do ensino fundamental.
Embora os desafios persistam, os dados apontam sinais de recuperação. Entre 2022 e 2024, a taxa de analfabetismo entre crianças de 8 anos caiu de 29,9% para 23,3%. Entre as crianças de 9 anos, o índice recuou de 15,7% para 10,2%.
“Sabemos que na educação leva-se muito mais tempo para superar os impactos. É fundamental continuar investindo em políticas como o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, que visa garantir o direito à alfabetização das crianças na idade certa”, destacou Liliana Chopitea, chefe de Políticas Sociais da Unicef no Brasil.
A pesquisa também reforça que as desigualdades educacionais estão diretamente relacionadas às condições econômicas das famílias. Crianças de famílias mais pobres foram desproporcionalmente afetadas pelas interrupções educacionais, enquanto as de famílias com maior renda tiveram mais recursos para mitigar os impactos.